O deserto.
Com a dor, o deserto te invade, tudo é o deserto.
Fica-se sozinho.
A morte e o abandono te enterram.
A dor é tão forte que se deseja o deserto, só ele conforta.
Fica-se tão só que aqueles que o amam te procuram e não te acham.
E lá não há nada.
Só o sol devastador de dia e o suplício do frio à noite.
Os dias se arrastam no deserto.
Bebe-se as próprias lágrimas.
A dor não diminui, acostuma-se com ela.
O sol dilacera e consome a pele e espera-se pela noite e a desolação do frio.
Lentamente passa-se a andar pelo deserto, cobras e escorpiões te fazem companhia.
Procura-se, sem querer encontrar, uma sombra que não existe.
Vê-se miragens de pessoas amadas, amigos que não te acham.
O dia todo, caminha-se sob o sol.
Não há descanso, só ruínas.
À noite, cobre-se com pedras, que te machucam mais que o frio.
A dor se cristaliza e o sangue escorre mais lento, mas a ferida não fecha.
Sente-se sede, mas não há água, nunca houve.
Encontra-se uma caverna.
Melhor ela, escura, abafada, fria como o túmulo que tanta dor causa.
Fica-se nela.
Lá fora o deserto.
A dor faz pensar.
Ouve-se gritos do teu nome.
Os olhos se acostumam com a escuridão.
As trevas confortam e é possível ver os detalhes do fundo da caverna.
Nega-se o outro lado.
A ferida ainda aberta não sangra mais, mas dói como antes.
A sede aumenta, lágrimas amargas demais.
Quase se tem fome.
Olha-se para a luz e a vista dói.
Tem-se a sensação de vultos, sombras que te procuram.
Vê-se uma mão.
Alguém grita o teu nome.
Nada.
A dor é sua amiga.
As lembranças são o que lhe dá forças.
A vida é cruel demais.
O amor é frágil e poderoso e, até que ele entre na caverna, a luz fica de fora.
Sonha-se que está caindo, e o teto da caverna é baixo.
O sofrimento cede, a dor não.
A luz te chama, saudades de caminhar pelo deserto.
Vai-se até a entrada, os olhos doem, um cheiro incomoda, melhor sair da caverna e enfrentar o deserto.
Anda-se com vigor, corre-se para fora.
A ferida não sangra, mas fica aberta, a carne viva, sem cicatrizar.
Acostuma-se com a mesma dor.
Uma nuvem te protege.
O sol sente vergonha.
Avista-se uma árvore, talvez seja o fim do deserto, talvez só mais uma miragem.
Alguém que você ama te oferece água e você finalmente aceita.
As nuvens aumentam.
Chove.
O calor se abranda.
O verde nasce tímido.
Chove.
Lobos aparecem e te seguem.
Alguém te dá à mão.
Um sorriso se rompe.
A dor ainda é a mesma.
Chove.
Pequenos arbustos e minúsculas flores se revelam.
O deserto acaba, a dor não.
Um bosque te acolhe e, mesmo com a dor, espera-se pela primavera.
(Título mutante, muda conforme a data contada do dia mais infeliz da minha vida)
Rêmulo Vaney Carrozzi
Tão lindo e tão triste ao mesmo tempo. Dor e vazio…
Sim, mas acaba com e primavera
Nice post thanks foor sharing
Thank you my friend