Então eu vi queimar, tudo virou cinzas que o vento levou tão linda e docemente. Tudo queimado até o final, do entardecer ao nascer do outro dia. Mas nada havia acabado. Nem a dor, nem a esperança. A casa, aquela que testemunhou todo o meu tormento, queimou; virou cinzas e foi levada pelo vento.
Então eu parti, depois que o último grão de areia ficou livre da última cinza. Nada mais havia ali pra mim. Dei as costas aquele espaço vazio e fúnebre. Deixei algumas lágrimas tolas rolarem, elas nunca me ajudaram em nada, só me denunciavam.
Depois de dias na estrada, sem água e nem comida eu desejei comer as cinzas, mas o sol esquentava a minha carne até que eu secasse, até que eu morresse. Mas sou feito de pedra e gelo. Sou coberto de pó e angústia.
Sou o deserto.
Não morro como as flores. Morro como as pedras.
Comi a chuva e bebi o vento, e a areia me acariciando os cabelos me consolou. Fez parte de mim a terra. Escura e azeda, vital. Numa caverna deitei por uma noite e acordei mil anos depois.